domingo, 11 de dezembro de 2016

A minha namorada campónia que faz incursões de espiritismo numa mina

A minha namorada divide o seu dia entre a agropecuária e a protecção do nosso plano de existência das ameaças sobrenaturais. Enquanto escrevo isto ela está numa mina a combater fantasmas. À data, ninguém lhe agradeceu.

Após longos períodos de incerteza existencial, a trabalhar para uma firma que a desvalorizava enquanto criava conteúdo tecnológico questionável para consumo, decidiu abandonar a sua vida anterior e dedicar-se à quinta que o avô lhe deixou. Hoje é uma feroz entrepeneur, produzindo vegetais e derivados animais em grande escala (esquecendo que o metal no bolso priva outros agricultores do seu pão), feliz no seu trabalho de sol-a-sol, nem lembrando o tempo em que se queixava quando trabalhava 9 horas por dia em vez das 8 contratadas.

Hoje o seu dia é empenhado em jornadas taxativas intelectualmente, como procurar um vegetal específico para o qual há procura ou limpar mais um andar numa mina abandonada. Longe estão os dias de labuta ingrata, subjugada por um patronato que apenas lhe dava 22 dias úteis de férias. Férias é quando um homem quer! Mas como ela é mulher, as férias começam no velório.

Mas as 16 horas diárias de suave ceifar, cavar e expurgar não são o limite dos seus prazeres. Também se dá ao activismo político, advogando por uma loja de conveniência que escoa os seus produtos a preços inflacionados, demonizando o empresário de uma superfície de médio-porte que apenas tenta satisfazer as necessidades dos consumidores e ao fim do dia deixá-los com dinheiro suficiente no bolso para comprarem medicamentos ao usurário do médico da aldeia, que se comporta como um vendedor de água no deserto.

Eu? Eu só tenho vantagens com os seus novos amores. A polpa dos seus dedos deixou de ser áspera do incessante teclar, agora o contínuo calo que se tornou a sua palma tem uma suave acção esfoliante no meu dorso. Quando fazemos amor, sinto que estou conectado à mãe terra, mas dói um pouco quando se entranha no prepúcio. Os meus fetiches de necrofilia tornaram-se todos realidades, quando ela chega à noite sem energia, nem a respiração se nota. E as minhas noites são tranquilas, sabendo que os espíritos dos meus ente-queridos padeceram ao gume da sua espada em mais uma jornada para assaltar o solo dos seus minérios.

Minha querida namorada, não jogaste Stardew Valley suficiente por uma vida?

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