quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Das “pessoas felizes”

Existem pessoas que são felizes. E existem pessoas que são “felizes”. Todos nós conhecemos um punhado delas.

Pessoas que atingem tons de voz próximos do ultrassom, não indo abaixo de um falsete do Freddy Mercury numa situação mais séria. Que transformam qualquer discussão numa cefaleia, com um discurso de tal modo acéfalo, que poderia ser produzido por uma inteligência artificial programada numa caixinha de música ou uma box da Zon (a capacidade é semelhante).

Essas pessoas são especiais, tornando mais brilhante o dia de qualquer ser que entre em contacto com elas, devendo-se tal à patine de graxa que untam em tudo o que mexe e tenha o infeliz acidente de ficar preso na mesma sala que elas. Mas também são especiais do mesmo modo que as crianças e os declaradamente infradotados o são. São “especiais”.

As criaturas “felizes” não medem habitualmente as palavras, espalhando o seu charme indiscriminadamente, seja a discutir secreções nasais esverdeadas durante o almoço ou a forçar uma tertúlia com alguém que claramente não está nem esteve na última década disposto a discutir futilidades sem ser a troco de sexo.

A característica que mais me admira nessas pessoas não é tanto a sua crónica alegria (a que faço alergia) ou a vaga sensação de que o seu espaço intracraniano não tem beneficiado das más políticas de arrendamento em Lisboa. É a sua honesta e abrangente falta de noção. São os entes que entram numa sala em silêncio e, não obstante o aspecto soturno da situação, começam a contar pormenores inúteis sobre os filhos. São os que olham para nós subsequentemente, esperando pelo nosso olhar aprovador como se a validação da forte escolha de tema para um metafórico funeral fosse substrato para o seu crescimento pessoal. São as que se imiscuem em temas de conversa que estão tão para lá da sua capacidade e conhecimento que o primeiro monossílabo introduzido no diálogo consegue provocar a ruptura de toda uma área da ciência ou filosofia.

Obrigado pessoas felizes por me estragarem o almoço.

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